Calibre 22, de Rubem Fonseca | resenha

capa de Calibre 22 na edição da Nova Fronteira

Calibre 22 é o segundo livro do Rubem Fonseca que eu trago para o blog. E é um livro em que os contos em geral repetem a fórmula consagrada do autor. É fácil de reparar que todos os contos são narrados em primeira pessoa e que é o narrador quem comete as ações violentas que os contos geralmente possuem. É significativo também que os narradores quase sempre são homens.

É desnecessário dizer que a estética de Rubem Fonseca é a da espetacularização da violência. A narrativa das histórias se orienta pelo excesso, pelo grotesco, pela brutalidade. Os personagens, mesmo os mais banais, não têm escrúpulos em cometar os crimes e esses crimes quase sempre são extravagantes – às vezes espalhafatosos, cômicos.

Em questão de estilo, a linguagem busca se aproximar do oral. A sintaxe é simples, quase todos os contos têm palavrão. Esse estilo dá suporte a tudo o que foi dito sobre o estilo do autor.

Dá para dizer com alguma tranquilidade que eu poderia escrever a mesma coisa para todos os mais de 30 livros de ficção que o Rubem Fonseca escreveu ao longo da vida. Apesar disso; os livros obviamente possuem particularidades. As de Calibre 22 são alguns padrões que se repetem e dois contos em particular que possuem uma estrutura diferente dessa descrita.

A primeira dessas repetições que eu posso mencionar é a obsessão que alguns personagens têm por bichos. Mais uma: poucos personagens possuem nome, e os que possuem em geral são chamados ou por nomes de personagens de outros livros ou de escritores. A terceira é a presença de anões. Tem dois contos que fogem um pouco dessas regras: o chapéu-panamá e a melhor profissão do mundo.

O chapéu-panamá é narrado por um cara misógino que aos poucos se apaixona por uma mulher. O interessante da história é como esse narrador se contradiz e tem consciência dessa contradição. Ele critica o desejo das mulheres de falar sobre qualquer coisa, diz que as mulheres falam que são um inferno. Também diz que odeia qualquer pretensão de intelectualidade.

De repente, se transforma. Se apaixona por uma mulher. Fala com orgulho que tem centenas de livros. E conta a história do chapéu-panamá, típica história que ele odiaria escutar antes dessa metamorfose. E tudo isso acontece sem violência física. Sem agressões. Sem traumas.

A melhor profissão do mundo também está fora do padrão de histórias do Rubem Fonseca. O conto é narrado por uma jovem – único conto do Rubem Fonseca que tenho lembrança de ser narrado por uma mulher. Uma jovem de classe baixa, que trabalha como enfermeira em um hospital para sustentar ela própria e a mãe.

Aos poucos, a rotina como enfermeira fica insuportável. Essa mulher decide ser prostituta, seguir a profissão da mãe. O que me chamou a atenção nesse conto foi a relação de amizade que essa narradora criou com um médico. Acho que é a única relação de amizade genuína nos contos do Rubem Fonseca. É uma quebra enorme de expectativa.

Diferente de O cobrador, não dá pra dizer que Calibre 22 é uma exceção dentro da obra de autor. É o contrário, os contos se encaixam muito bem do estilo consagrado do autor. Por isso as exceções de Chapéu-panamá e A melhor profissão do mundo são tão interessantes.

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